Não sou muito de assistir a trailers. Quando acabo assistindo um por acaso, quase sempre saio decepcionado; seja com a própria prévia ou com o filme mais tarde. Entretanto, o trabalho que fizeram com “Crimson Peak” pareceu sincero o bastante para chamar minha atenção; não pelo nome de Guillermo Del Toro, mas pelos visuais de extremo bom gosto. A não ser que tivessem refeito o filme completamente entre o lançamento do trailer e a obra em si, seria extremamente difícil se decepcionar com tal aspecto. Este longa-metragem, apesar de longe da mediocridade, deixa para desapontar seus espectadores em outras áreas.
Ambientado na Era Vitoriana, este conto de Terror acompanha a jovem Edith Cushing (Mia Wasikowska), uma aspirante à escritora determinada a alcançar o sucesso. Em uma viagem de negócios os misteriosos irmãos Sharpe entram na vida de Edith, procurando estabelecer uma parceria com a firma do pai da garota. Uma tragédia familiar ocorre e deixa a garota desamparada, que eventualmente busca apoio ao casar-se com Thomas Sharpe (Tom Hiddleston). Eventualmente, o casal e a irmã de Thomas mudam-se para a mansão da família Sharpe, um lugar que exala obscuridade em tons de carmesim.
Uma análise superficial revela que talvez não haja motivos para preocupação neste longa-metragem. A parte visual corresponde ao que se mostrou nas prévias, elegante e apresentando uma composição invejável: ambientes complexos, recheados de arquitetura rústica e uma decoração que ostenta o adjetivo sinistro em sua madeira envelhecida. Da mesma forma como “Pacific Rim” prestou homenagem aos filmes de monstros, mostrando o lado bom e os clichês do gênero, esta obra faz dedicatória aos trabalhos de Terror do passado. Em um lado a abordagem do universo kaiju foi mais explícita, aplicando quase diretamente alguns elementos de gênero na obra, enquanto em contrapartida o que se mostra aqui é mais sutil e contido. Em termos de cenário, por exemplo, nota-se um certo exagero do estereótipo da mansão mal assombrada; o ambiente beira a poluição visual com tantos elementos em cena. Porém o que se atinge está mais para uma visão original do que um excesso gratuito, uma pegada que inclusive lembra as bizarrices de Tim Burton.
A história começa de maneira segura, introduzindo um contexto demasiadamente calmo e sereno, com um status quo bem definido. Logo chega o elemento estranho e exerce sua influência sobre o equilíbrio de antes, dando início à corrente de terror vista aqui. Ter uma estrutura conhecida não revela problema imediato, ainda mais quando há uma clara tendência saudosista, é por conta um desenvolvimento vacilante que este modelo acaba não vingando. Em certo momento da história, um personagem critica o conto escrito pela protagonista e diz que o mesmo tem fantasmas sem sal e carece de romance. Não é exatamente o que acontece aqui, mas chega perto o bastante para chamar a atenção. Todo o lance com fantasmas é deixado de lado, menos como um coadjuvante e mais para algo mal desenvolvido. A presença de um monstro na história parece existir por simples obrigação do gênero, a fonte de um punhado de sustos. Ao mesmo tempo que o romance, que era para ser uma parte importante, acaba parecendo igualmente pouco explorado. Não parece haver uma decisão sobre qual fator devia ser predominante, resultando em um mau uso de dois focos com ótimo potencial.
No entanto, não é porque a história desaponta que a direção segue o mesmo caminho. As técnicas usadas pelo diretor para ilustrar sua obra mostram que seu talento não se limita a pretensão, sua dedicatória ao Terror clássico é séria e é executada com sofisticação. Quando o espectador é inserido no ambiente do iníciodo filme, com todo o requinte da burguesia da época, temos o uso de um foco frívolo, suavizando muitos elementos da tela e dando um tom de delicadeza às imagens. A vida de Edith está nos eixos, repleta de encontros de gala e sonhos — vemos uma aura angelical sobre sua imagem. Sua estadia na mansão, contudo, mostra uma entonação totalmente diferente. Fontes de iluminação fortes em ambientes escuros estabelecem contrastes pesados, delineando grosseiramente traços do cenário e dos personagens. Ainda que esses toques pareçam ser apenas de um caráter estético, eles acabam sendo parcialmente responsáveis pelo estabelecimento do clima da obra, um aspecto essencial para o sucesso de um filme de Terror.
Como reforçado, a apresentação da obra não é algo que será fruto das reclamações dos espectadores. O diretor faz seu trabalho muito bem ao utilizar os vários recursos disponíveis a ele, tal como o cenário e sua centena de detalhes. Tudo é melhor visto quando o manejo do material não decepciona, coisa que não acontece com a história. Fantasmas e romance são dois pontos fortes no enredo, que poderiam ter sido bem desenvolvidos isoladamente ou ainda melhor em conjunto. Não há pendência para nenhum dos dois lados que possa marcar este longa como um filme de fantasmas ou um romance aterrorizante, existe apenas um equilíbrio indesejável que mata qualquer tipo de potencial almejado.