Uma produção brasileira, este filme de cerca de R$300.000 é um conto curioso sobre um mundo devastado, onde criaturas semelhantes a zumbis rondam a terra e onde os vivos são hostis uns com os outros. Em um contexto vagamente similar à “Mad Max“, o policial (Rafael Tombini) roda pelas estradas, com um carro V8, em busca de um assassino em série possuído por uma entidade. No caminho, obstáculos e pessoas de ambições diversas mostram que do mundo antigo pouco resta além do instinto mais básico do ser humano: a sobrevivência.
Tecnicamente, este filme acaba deixando um pouco a desejar em várias áreas. A direção e roteiro de Davi de Oliveira Pinheiro não são exatamente algo que se chame de sólido, pois em várias ocasiões, sem levar em consideração a trama propriamente dita, não se sabe por que os personagens estão naquele lugar ou o que estão fazendo exatamente. Sabe-se que o longa é um road movie apocalíptico, então os lugares visitados acabam sendo as paradas que o policial faz no trajeto. O que não faz sentido é o que é feito nessas paradas, acontecimentos que estão além do mero acaso, são simplesmente bizarros. A direção faz seu trabalho de representar em imagens o que está no papel, mas também não apresenta nenhuma novidade, além de apresentar alguns erros ocasionalmente. Até em cenas simples, como filmar um plano de grande conjunto com pouca ação, o enquadramento mostra-se um tanto esquisito por gravar espaços vazios sem motivo algum. O resultado é um desvio da atenção do espectador para algo irrelevante para o desenvolvimento da cena, tal como acontece em uma ocasião onde dois personagens estão conversando e cerca de 40% da tela está preenchida com um pleno vazio. Se o núcleo da sequência é transmitir algum sentimento ou ilustrar uma conversa, a base da cena deve apresentar de maneira mais clara possível o que está acontecendo, coisa que não se atinge com uma disposição de elementos ruim e ângulos inapropriados.
Mas o que é realmente de tirar o foco, curiosamente, não é tanto a direção; a mixagem de som também mostra-se como falha, para dizer em poucas palavras. Se o diálogo foi realmente feito do zero no pós-produção, então algo certamente deu errado na hora da mixagem. O voluma das vozes chega a ser quase inaudível em certos momentos, detalhe que não se aplica ao resto dos efeitos. O volume geral do filme está apenas totalmente mal ajustado. Então se o volume for aumentado para que as vozes sejam melhor ouvidas, os efeitos sonoros ficarão em um nível ensurdecedor. Não que os diálogos sejam lá algo maravilhoso de se ouvir, mas ao menos eles situam o espectador melhor na história.
Inicialmente, as poucas explicações dadas para o espectador criam um tom de mistério interessante, um certo interesse sobre a história e o universo até chega a ser despertado. Não se sabe quem é o personagem principal ou quais são suas intenções, nem o que aconteceu naquele ambiente e por que o protagonista está ali. Tais questões mostram-se relevantes para a estruturação do clima da obra, mas dúvidas não passam de promessas vazias se não há nenhum resultado na sequência. Explicações extensas sobre o passado do elenco estão longe de ser uma solução ideal, ao mesmo tempo que deixar o espectador no escuro do começo ao fim se mantém como uma decisão igualmente infeliz. A trama do policial atrás do assassino é simples o bastante para ser contada de maneira clara, embora arrisco dizer que não se sabe nada mais de possessão no fim do longa-metragem que se sabia no começo. Através das atuação muito fracas e dos diálogos desimaginativos, a narrativa acaba sofrendo por ser pouco explorada. O universo até pode manter seu mistério sem que a trama sofra, mas uma luz poderia ter sido lançada nos personagens ou no contexto da história em questão. Por exemplo, os zumbis, não necessariamente respondendo por esse nome, são visualmente bem feitos, com uma aparência boa na maior parte do tempo; enquanto seu espaço no ambiente e seu comportamento não são nem de longe bem trabalhados. Em certo momento os personagens se sentem ameaçados pela presença das criaturas, já em outro as encontramos compartilhando o mesmo ambiente que os humanos, ignorando sua presença e sendo igualmente ignorados. Esta indecisão transmite pouco conteúdo por si e faz com que outras cenas percam qualquer potência dramática que teriam, um tiro no pé com duplo efeito negativo.
No começo, como dito anteriormente, não se sabe muita coisa sobre a história; e se por um lado este mistério tem um lado positivo, o conteúdo em tela acaba estragando esta parte boa. A ação deste filme decepciona por ser totalmente má executada e incoerente, deixando poucas chances de redenção restantes. Logo de cara somos introduzidos ao protagonista sem nome, que sem explicação entra em uma sala e atira em três homens desarmados. Em seguida, um inimigo oriental entra armado de uma espada em cena e o policial falha em atirar na única pessoa que apresentava perigo a ele, sendo dominado na consequente briga. Na hora do golpe final, o indivíduo, com explícita habilidade em artes marciais, erra o golpe de espada e acerta a parede. Não é uma solução inteligente e muito menos algo palpável ou coeso com o que acabou de ser mostrado. As próprias regras do filme são quebradas em prol da conveniência, algo similar com o que acontece com os zumbis.
Nem tudo é uma decepção neste longa-metragem brasileiro, no entanto, pois crédito é devido ao responsável pela escolha de ambientes, que cumprem muito bem seu papel de apresentar um caráter apocalíptico. Considerando o relativamente baixo orçamento, em comparação com grandes produções, acredito que o trabalho feito com os ambientes é esteticamente agradável, além de funcional para o clima do filme. A maquiagem também é impressionante em diversas ocasiões, deslizando por vezes, porém nunca chegando a ser exatamente mal feita. O sangue, por outro lado, não é nem um pouco convincente e mais parece um refluxo de uma indigesta geléia, que nem tom avermelhado possui. Sendo uma tremenda frustração, este filme entrega pouco em quase todas os aspectos. Isto me levou a pesquisar um pouco sobre a obra, mais especificamente no material do kit de imprensa enviado. Lá pode-se ver que as influências de filmes de gêneros variados não são poucas, indo do faroeste spaghetti até os filmes de zumbi de Romero. Infelizmente poucas delas foram minimamente impressas no raso produto final. Ao menos este é possivelmente o único filme a mostrar uma grávida empunhando uma besta, o que deve ter seu mérito por menor que seja.