Antes deste filme, existiu outro “Cape Fear” em 1962, baseado no livro “The Executioners” de 1957. Esta versão de 1991 é um remake da versão dos Anos 60, atualizando alguns detalhes, mas mantendo grande parte da obra original intacta. Curiosamente, três atores que participaram do original aparecem em pequenos papéis aqui: Robert Mitchum, o vilão de antes como um oficial de polícia; Gregory Peck, o mocinho agora como um advogado; e Martin Balsam, um policial antes, agora aparece como um juiz.
Em 1977, um advogado faz a defesa de Max Cady (Robert De Niro) na corte, acusado por estupro e agressão sexual. No fim do julgamento, Cady é condenado à prisão e lá permanece por 14 anos. Na cadeia, o prisioneiro analfabeto aprende a ler, estuda livros de Direito e passa a ser seu próprio advogado, descobrindo alguns reveladores detalhes, antes desconhecidos, sobre seu caso. Após o fim de sua sentença, o ex-prisioneiro vai atrás de Sam Bowden (Nick Nolte), seu advogado, para tirar satisfação pelos anos que passou preso. Inicialmente apenas coercitivo, Max Cady logo revela que sua estadia na cidade de Bowden é mais que uma visita desagradável.
Sendo um filme de Martin Scorsese, diretor com respeitável carreira, uma expectativa alta sobre a qualidade geral esteve presente. Com isso em mente, algumas dúvidas surgiram sobre o longa-metragem, que no fim revelaram alguns infortúnios sobre a direção de Scorsese. Sem ter visto a obra de 1962, não foi possível notar em quais pontos este longa se assemelha ao original. Com isso em mente, após notar alguns momentos extremamente mal dirigidos, a possibilidade de esta ser uma refilmagem quadro-a-quadro do antigo foi levantada. Por estes trechos serem tão fracos, uma luz negativa acaba destoando-as do resto da obra, que por si não é um dos esforços mais notáveis do diretor. A representação da violência, característica do cineasta, continua excelente e se exalta por ser bem executada, enquanto algumas sequências nem parecem vir da mesma pessoa por sua execução falha. Em certo momento, vemos uma cena de briga onde três homens armados são dominados por outro desarmado. Em uma indústria de sonhos realizados, tal tarefa não deveria ser necessariamente um problema.
Não é necessário que o ator seja algum tipo de mestre de artes marciais para dar vida à cena, pois dublês e até mesmo técnicas de montagem podem resolver o problema de apresentar uma situação complexa. O que se tem é uma demonstração falha, que transmite a mensagem de uma maneira clara, porém pouco inspirada. Os movimentos não parecem ser realmente convincentes, apenas convenientes o bastante para que o espectador entenda que aquele homem venceu seus oponentes. Outros momentos menores apresentam uma execução similarmente decepcionante, só que por serem menos importantes acabam chamando menos a atenção. Ainda que as unidades mais específicas de filme contenham sua parcela de falhas, no geral se mantém uma competente atmosfera de suspense. O ritmo do longa, com exceção do abrupto início, está em uma perfeita junção com a história apresentada. Não se sabe o que Max Cady vai fazer à seguir, uma vez que o roteiro consegue manter um ar de imprevisibilidade em cima de seus próximos movimentos; o que pode levar o espectador a pensar que o ataque foi meticulosamente planejado nos 14 anos de prisão, assim criando tensão constante até a conclusão propriamente dita.
Quem realmente rouba a cena, não surpreendentemente, é Robert De Niro com sua atroz interpretação do antagonista principal. Sua atuação não é apenas brilhante por si, é ainda melhor pelo fato do ator capturar perfeitamente a essência de Robert Mitchum em seu papel. Como dito, não vi o original de 1962, mas é muito fácil ligar os pontos e ver que De Niro está essencialmente reproduzindo a magia dos vilões da carreira de Mitchum. Os maneirismos, o jeito de falar e as expressões faciais criam a característica atmosfera do ator, acrescentadas de um sotaque, que serve como toque pessoal de De Niro. A presença do ator em cena é atrativa, ainda que seu personagem seja ameaçador, e ele parece estar se divertindo no papel; empolgação esta que às vezes é tanta, que seu vilão parece um pouco exagerado em certos momentos. Em termos de elenco o desempenho da equipe é agradável, com exceção da terrível Juliette Lewis. Longe de qualquer sombra de sua personagem em “Natural Born Killers“, aqui ela interpreta uma garota de 15 anos com dificuldade de lidar com a relação conflituosa de seus pais. Apesar de ter uma idade compatível com sua personagem, a atriz consegue entregar uma interpretação completamente alheia ao resto do filme. Não se vê traços de dúvida, conflito ou curiosidade, comuns na adolescência, em sua personagem, que parece estar tão deslocada do contexto do filme quanto poderia estar, seja ele simples ou mais complexo.
Os eventuais deslizes marcam presença e são graves o bastante para atrapalharem a experiência, ainda que sejam menos intensos que os acertos. O suspense e a atuação de De Niro permanecem como os pontos mais fortes, contrastando a direção inconsistente de Scorsese e a péssima atuação de Juliette Lewis, que de alguma forma conseguiu uma indicação ao Oscar. Ainda assim, ver este longa-metragem vale a pena pela chance de ver Robert De Niro sendo mais Robert Mitchum que o ator em pessoa, também presente na obra.