“Mil Vezes Boa Noite” é um filme de 2013 dirigido por Erik Poppe, um ex fotógrafo que nos Anos 80 cobriu diversos conflitos na América Central, Oriente Médio e a Ásia. Com alguns elementos auto-biográficos, esta obra reúne Nikolaj Coster-Waldau e Juliette Binoche num tocante drama sobre o conflito entre dois tipo de vide: pessoal e profissional. Quando um dos dois é mais fraco fica mais fácil escolher, mas e quando o trabalho de completa como pessoa e a família traz o conforto de uma casa que pode ser chamada de lar?
O enredo acompanha Rebecca (Juliette Binoche), uma fotógrafa profissional que acompanha conflitos por todo o mundo, até que um acidente de trabalho a força a voltar para casa. Voltando para a vida em família, composta por seu marido Marcus (Nikolaj Coster-Waldau) e suas duas filhas, ela promete que nunca mais deixará sua família. A partir do momento que Rebecca volta para casa, Marcus deixa claro que não suportará mais o estilo de vida perigoso de sua esposa, mas esta ama seu trabalho e família e demais para estar completamente disposta a abrir mão de um dos dois.
“Mil Vezes Boa Noite” apresenta uma proposta formidável e especialmente interessante pelo diretor ter experiência com o assunto da história. No entanto, essa promessa não é totalmente cumprida quando a trama deixa a desejar em vário momentos. Gostaria de classificar este como mais um filme alternativo que usa a premissa como fachada para algo experimental, mas várias sequências relevantes provam o contrário. Isso não evita que em momentos o longa fosse tão lento e carente de acontecimentos que a vontade de rotulá-lo era grande. O principal defeito está justamente aqui é justamente esse: não saber dosar quais cenas fazem a diferença e quais são inúteis. Para efeito de comparação, esta obra me lembra um tanto minha mãe nas redes sociais. É frequente estarmos conversando e do nada receber algum vídeo imbecil no meio da conversa sem contexto algum; mais ou menos o que acontece aqui. O longa mostra algo importante acontecendo na tela e sem aviso insere sequências psicodélicas, sem sentido algum ou significado relacionado ao contexto da trama.
Essas pretensiosas cenas pseudo-filosóficas causam uma quebra violenta no ritmo que nunca foi muito bem cadenciado, em primeiro lugar. Pior do que fazer o longa parecer mais lento ainda, essas quebras dão a impressão de certo desleixo do roteiro, pois ele não dá a impressão de que aquilo tem qualquer relevância. Até entendo cenas do cotidiano que, quando contadas por cima, não possuem nenhum conteúdo relevante, porque normalmente estas mesmas cenas ajudam no desenvolvimento dos personagens. Agora, estas outras sequências não adicionam absolutamente nada a história e, mesmo se analisadas isoladamente, não têm nada de chamativo sobre elas.
Ao menos o resto do filme consegue ser bem substancial, pois as cenas que querem alcançar algum objetivo conseguem com tranquilidade. Um exemplo claro é visto quando Rebecca trabalha em campo, cenas em que a experiência do diretor como fotógrafo profissional é claramente evidenciada. Em primeiro lugar porque há a constante tensão de vê-la em um ambiente perigoso apenas para tirar umas fotos. É óbvio que algo ruim está para acontecer e a vontade é de arrastar a protagonista para longe dali, enquanto a audiência só pode assistir ela se arriscar daquela forma. Além disso, há um chamariz estético em tais sequências. A cinematografia simula o efeito de uma câmera fotográfica, como se tudo fosse um making of das fotografias de Rebecca. O cuidado é tanto na composição de tais cenas que se pausarmos em qualquer momento dificilmente se terá uma imagem longe de belíssima.
Mais que uma direção sólida nas sequências envolvendo o trabalho de campo da fotógrafa, o ponto mais digno de destaque é a atuação soberba do elenco. Nikolaj Coster-Waldau rouba a cena ao entregar emoções tão orgânicas e puras quanto elas podem ser. Seu desempenho ao ilustrar as emoções confusas de um marido e pai preocupados é o que realmente salva o filme em vários momentos. Juliette Binoche também não desaponta, entregando uma interpretação digna de atenção apesar dela não ter tantas oportunidades para dar uma atuação tão impactante quanto a de Coster-Waldau. Outros bons personagens são as filhas do casal protagonista, que, apesar dos papéis limitados, conseguem entregar atuações muito satisfatórias.
Mesmo contando com seus pontos fortes, esta obra falha em entregar uma experiência sólida no contexto geral; os momentos ruins fazem sua presença ser mais sentida. Tendo uma progressão lenta, faltou cuidado na hora de escolher cenas que não abalem tal estrutura. Estou falando das intermissões abstratas que tanto incomodam a tornam a experiência pior que muito devagar, ocasionalmente ela era desprovida de sentido. Válido pela atuação singular do enredo e pelas sequências de fotografia em campo, “Mil Vezes Boa Noite” tinha muito potencial para ser melhor do que é, mas isso infelizmente não acontece.