Continuando a semana Godzilla temos “Godzilla vs. Hedorah”, outro filme polêmico da franquia. Esta obra levanta sobrancelhas por diversos motivos. Seja pelo monstro esquisito, pela apresentação psicodélica ou ainda pelo “Godzilla Jetpack. Tudo se resume a uma coletânea de sequências com pouco sentido somadas a uma trilha sonora duvidosa e outros elementos que poderiam ser de qualquer outro filme, menos um do Godzilla. Este longa pode não ser o melhor da série, com certeza não é o pior, mas sem dúvidas é o mais bizarro de todos até então.
Logo de começo há um tira gosto dessa loucura com uma abertura totalmente inspirada no trabalho de Maurice Binder com a franquia James Bond: a imagem de uma mulher cantando alguma música popular da época com os créditos e uma arte meio psicodélica rodando no fundo. Mas detalhes à parte, a história se trata da ameaça de Hedorah, um organismo alienígena que chega na Terra e se alimenta do lixo despejado pela população para se desenvolver. Aproveitando também da poluição gasosa liberada pelas indústrias, o monstro logo se torna uma ameaça para a população quando a taxa de mortalidade sobe drasticamente. No fim das contas, sobra novamente para Godzilla derrotar esse alienígena, que, mesmo esquisito em todos os sentidos, prova ser o monstro mais mortal até o momento. Diferente de outros filmes da franquia, o número de mortes é computado e comunicado ao espectador.
O enredo segue um ritmo extremamente lento, quase parando por grande parte do tempo; em vários momentos chegando a ser uma experiência bem cansativa, com pouca coisa acontecendo tanto na parte humana da história como nas sequências entre os monstros. Por exemplo, há incontáveis cenas onde Hedorah simplesmente derrete por aí — este é um dos seus poderes. Em uma cena, várias pessoas estão dançando numa festa e do nada todos ganham peixes no lugar dos rostos, então a gosma tóxica aparece derretendo para dentro do clube e volta pelo caminho que veio sem realizar nada mais que assustar as pessoas. Toda a sequência toma um bom tempo de tela, exemplificando bem o tipo de cena que deixa o filme tão maçante em certos pontos. Isso sem contar outras sequências aleatoriamente inseridas — como as de desenho animado — que não mostram nada muito relevante e não adicionam nada para a trama.
Pelo menos introduzem Godzilla bem cedo na trama, então o clima lento é um pouco amenizado pelas cenas de luta entre os monstros. Ainda assim, estas também são um tanto esquisitas. Não necessariamente ruins, mas como exatamente se faz para lutar contra um monstro feito de gosma tóxica? Tudo bem que em alguns momentos o monstro simplesmente muda de densidade e passa a ser algo mais concreto, mas em vários outros momentos ele simplesmente derrete quando Godzilla tenta acertá-lo. Em primeiro lugar, poderiam ter pensado no potencial do monstro de criar boas cenas de ação antes de simplesmente tentar improvisar. Na maioria dos encontros Godzilla simplesmente tenta atacá-lo sem sucesso, apenas para o monstro soltar alguma gosma ou gás tóxico e incapacitar temporariamente o Rei dos Monstros. A idéia até parece interessante, mas com o passar do tempo fica repetitiva e desimaginativa.
Para não dizerem que estou exagerando quando digo que este filme parece ter sido feito enquanto a equipe estava passando por um bizarro brainstorm criativo, apresento-lhes o Godzilla Jet Pack. No maior estilo Superman dos Anos 40 — que ganhava novos poderes conforme a necessidade da trama — Godzilla entra nessa onda e ganha o incrível poder de voar usando sua rajada atômica de um modo que nem Sigmund Freud explica. Claro que as circunstâncias de tal manobra não poderiam ser mais apropriadas: tudo isso acontece logo depois de Hedorah atacar uma festa hippie no topo do Monte Fuji — esta realizada pelo simples motivo de “Vamos ao topo do Monte e festar antes que os monstros cheguem aqui”. Nisso, Hedorah ataca e os monstros brigam, resultando no vilão fugindo pelos ares e Godzilla voando atrás dele. Os produtores também não pareciam saber bem o que fazer com o roteiro, pois trazem de volta uma criança como um dos protagonistas — no estilo “All Monsters Attack” — mas ao mesmo tempo criam uma atmosfera totalmente sinistra. Criticam a poluição num filme obscuro, mas usam desenhos animados para isso.
Por outro lado, a fotografia adotada pelo diretor Yoshimitsu Banno é uma mudança bacana, pois dá um toque de filme de terror que faz a fotografia coloridíssima de antes parecer simplesmente inapropriada. Uma paleta de cores mais acinzentada é usada, além da maioria das cenas se passar no período da noite e terem um tom mais sinistro que o próprio “Gojira“. Considerando que o longa tenta passar uma forte mensagem anti-poluição, o climão sujo e macabro se mostra uma boa adição a essa entonação, mesmo que a mensagem em si não seja passada da melhor maneira.
Certamente este é um dos filmes mais malucos que eu vi na vida e de longe é o mais incomum de toda a franquia. Francamente duvido que algum dos outros 17 filmes restantes consiga chegar nesse nível de esquisitice. De resto, “Godzilla vs. Hedorah” ainda tem alguns momentos legais perdidos entre a aleatoriedade e criatividade entorpecida, o que impede a obra de ser uma bomba completa.