“Hatfields & McCoys” se trata de uma adaptação para a televisão do famoso conflito entre as duas famílias do título, que ocorreu logo após o fim da Guerra Civil Americana. Mais que uma simples briga, a rixa perdurou por aproximadamente vinte e oito anos, de 1863 até 1891, rendendo um alto número de fatalidades e tragédias para ambos os lados. Curiosamente, membros das duas famílias participaram do programa “Family Feud” em 1979, com a família McCoy vencendo os jogos enquanto os Hatfields ganharam mais dinheiro no fim. Uma conclusão irônica para um conflito homérico? Sim. Mas que mostra como após quase um século ele ainda têm reconhecimento.
A minissérie foi dividida em três episódios de 1h30 de duração em média, formato similar a uma temporada de “Sherlock”. Os episódios focam em uma série de acontecimentos isolados, que em conjunto quase causaram uma nova Guerra Civil entre Virgínia do Oeste e Kentucky. Indo um tanto além de uma troca de tiros entre membros de duas famílias, o conflito se estende aos galhos da lei e até às conexões entre membros das famílias e os governos dos estados. A maneira como os acontecimentos são montados procura aumentar a tensão entre os dois lados cada vez mais, até que fique bem exposta. Tudo poderia ter sido feito de maneira solta, mas nesse quesito é executado solidamente. O mesmo não pode ser dito da progressão do tempo, a linearidade, no entanto, pois muitas vezes fica complicado se localizar em meio a tantos saltos temporais repentinos.
Por conta do conflito durar tantos anos e do tempo relativamente pequeno que a série tinha para representá-lo, acompanhar os acontecimentos cronologicamente é um tanto complicado. Para ajudar, a série não coopera nesse aspecto. Em um filme, os cortes normalmente são usados para mudanças de ambiente ou leves saltos temporais. Não poderia ser muito diferente aqui, mas em certas ocasiões o tempo entre um corte e outro costuma ser maior. De vez em quando alguns dias passam, ocasionalmente algumas semanas, raramente se passam meses e simplesmente abusam quando chega-se em algo perto de um ano, o que definitivamente deixa as coisas um pouco confusas e difíceis para o espectador se localizar.
O conflito é especialmente interessante por conta do aspecto moral envolvido, comum ao gênero, ainda mais por ser baseado em uma rixa real. Um dos lados se mostra mais inclinado a tomar a lei em suas próprias mãos, ao mesmo tempo que possui ligações com altas esferas do governo; enquanto o outro lado tenta resolver o conflito através de métodos dentro da lei, enquanto suas conexões estão nas esferas mais baixas da lei. No entanto, por mais que os amigos em lugares altos sejam diferentes, ambas as famílias abusam de seu poder para manipular a lei a seu favor. O que torna as coisas mais interessantes, entretanto, é que esta obra não se sustenta apenas com boas intrigas políticas; toda a parte que envolve colocar a mão na massa — ou nos revólveres — é muito bem feita. Com tiroteios que não devem nada para nenhum faroeste, este trabalho exibe competência no planejamento de cenas de ação; tanto as menores, quanto as maiores. Entregando reviravoltas constantemente até a resolução de toda a bagunça, esta minissérie não deixa de impressionar até o fim; com uma conclusão chegando a lembrar o final de “The Man Who Shot Liberty Valance”, ironicamente brincando com a moral do filme de John Ford.
Algo que definitivamente enriquece o conflito é a atuação do elenco, em sua maior parte, com uma porcentagem menor não atuando tão bem assim. Dou destaque a Kevin Costner, que pode ser considerado um dos protagonistas por ser o líder da família Hatfield. Nos sapatos de William Anderson ‘Devil Anse’ Hatfield Costner passa uma imagem forte de liderança e determinação, deixando totalmente plausível a forte crença que os membros de sua família têm em sua figura. Outro personagem interessante, mas por motivos diferentes, é Nancy McCoy, que possui uma aura curiosamente semelhante a de Atia of the Julii, de “Rome”, sendo uma personagem oportunista e levemente histérica belamente interpretada por Jena Malone. Entretanto, nem todo o elenco possui o mesmo brilho desses destaques, como pode se notar no claro exemplo de Johnse Hatfield. Pelo seu personagem ter certa importância na trama, fica fácil notar o potencial perdido. Ele poderia ter sido melhor representado, com certeza, especialmente por suas atitudes não se mostrarem claras nunca, parece maisé que são regidas pela aleatoriedade. Pelo menos levantam um questionamento interessante: se o personagem é completamente burro ou apenas mal interpretado.
Dos elementos que poderiam ter agradado mais, a trilha sonora é o mais proeminente deles. Falhando tantas vezes quanto acerta, esta coleção duvidosa de canções ótimas e péssimas não consegue manter um nível de qualidade estável. Nas ocasiões em que as melodias adotam uma entonação mais rústica, usando mais violões e banjos, as cenas são definitivamente enriquecidas pela música. Já em outros momentos, onde uma melodia mais moderna é usada, as cenas acabam sofrendo com o excesso de harmonias nos vocais. Tentam amplificar o impacto das ações retratadas e falham miseravelmente nessa parte. Felizmente, o dano causado pelas músicas ruins é limitado, uma vez que nem todas as cenas são acompanhadas de trilha.
No fim das contas, “Hatfields & McCoys” é uma minissérie que definitivamente agrada por muitas razões, mesmo que não acerte em todos. Seja por suas atuações boas, por sua ação extremamente bem montada ou pelo conflito em si, os vários motivos para gostar da obra mostram-se em maior número que os para não gostar. Recomendado fortemente tanto para os fãs de Faroeste, quanto para quem não gosta tanto do gênero. Com certeza vale a conferida, especialmente por ser curtinha.