“Escape from Alcatraz” reconta um dos feitos mais improváveis do sistema prisional dos EUA. Recapturado após fugir de uma prisão em Louisiana, Frank Lee Morris (Clint Eastwood) é enviado para Alcatraz, a estrutura mais segura e amedrontadora dos Estados Unidos. Construída sobre uma ilha a 2km da costa, cercada por correntes fortes e águas geladas, a cadeia é popularmente conhecida como “A Rocha” e considerada inescapável. Mas Morris não é estranho à prática de fugir de prisões e não desconsidera de forma alguma enfrentar a reputação de Alcatraz e seu diretor, que faz questão de ser tão desumano com os detentos quanto pode. Conforme a situação fica mais e mais insustentável, Morris passa a planejar como vai sair de Alcatraz, de preferência com vida.
Quem diria que “Escape from Alcatraz” é um filme baseado em fatos reais? Não só isso, como é adaptação de um livro homônimo sobre três prisioneiros que escaparam de uma das instalações mais seguras de seu tempo. Quem achou que este seria apenas um filme de Clint Eastwood fazendo algo impossível enquanto mantém pose de macho alfa está completamente correto, com o detalhe de que toda a jornada de organizar um plano de fuga e executá-lo ao longo de dias, semanas, meses e anos aconteceu de fato. E como toda história real, não existe nada inédito sobre os eventos do enredo, que apenas recontam fatos já divulgados na mídia anteriormente.
Dito isso, é claro que há a chance do espectador nunca ter ouvido falar dos eventos que deram base ao longa-metragem. No meu caso, conhecia a história da fuga apenas por cima, sem ter idéia de quem eram as figuras principais e como seus planos se concluíram. Assim, não foi familiaridade com os fatos ou conhecimento prévio do final que me fez estranhar “Escape from Alcatraz”, e sim a apresentação da história propriamente dita. Ou seja, como todos os acontecimentos acerca do aprisionamento, planejamento e execução do esquema de Frank Morris foram estruturados e transformados num filme. Este aspecto é meu maior problema com o longa porque ele abraça estas três etapas e se resume a elas sem desenvolvê-las a fundo. Pior, todas as tentativas de ir além são incrivelmente superficiais, sem chegar a lugar algum ou simplesmente largadas na trama sem que tenham uma presença significativa. Não que elas devessem ter protagonismo numa história sobre fuga de prisão, mas se a tentativa existe poderia ter sido melhor executada.
Também não é problema de incompatibilidade, pois nenhuma dessas ramificações foge do tema principal. Por exemplo, o roteiro claramente tenta estabelecer relações entre o protagonista e outros indivíduos dentro da prisão. Morris é confrontado pelo diretor logo nas primeiras cenas de “Escape from Alcatraz”, o qual reaparece ocasionalmente para relembrar que ele é uma pessoa desagradável, mas nada além disso. Nunca diria que ele é um vilão forte ou qualquer coisa do tipo porque sua conexão com os personagens e as coisas ruins que acontecem com eles é bem fraca. Tirando um momento marcante, o resto é todo bem solto e esporádico, sem mexer com o espectador e fazê-lo nutrir sentimentos fortes pelo vilão. Similarmente, tenta-se introduzir um tipo de antagonista menor que também nunca chega a marcar presença exceto por uma cena ou outra. Numa mesma pegada, as relações amigáveis do protagonista falham em fazer o espectador se importar com eles e, consequentemente, com o que vem a acontecer com alguns. Tudo é muito impessoal e efêmero para que faça alguma diferença concreta.
O roteiro não é dos mais sutis e deixa ocasionalmente claras suas intenções. Assim como não resta dúvida da função do diretor da prisão e de Wolf, um detento que persegue Morris, é fácil perceber quando a história está inserindo um momento de tensão momentânea; aquele em que parece que as coisas darão errado e tudo irá por água abaixo até o último momento mostrar que está tudo sob controle. Estas ocasiões, felizmente, não gritam suas intenções. Por mais que não estabeleçam um suspense sufocante de arrancar os cabelos e suar frio, eles funcionam por variar levemente a progressão relativamente simplista de “Escape from Alcatraz”. Sem eles, o filme não seria nada mais que pessoas escapando da prisão e só. Ao menos há um pouco de risco, de perigo e de chance de erro, um pouco que ainda não evita que a obra como um tudo seja simples demais.
Por outro lado, não posso reclamar da execução prática desta simplicidade em termos de direção de um filme de aventura. “Escape from Alcatraz” introduz bem muitos dos conceitos que foram utilizados incontáveis outras vezes em filmes de prisão. Em suma, a rotina de uma pessoa na cadeia e tudo de singular que acontece entre quatro desconfortáveis paredes de concreto maciço. Hoje, ver que existem grupos sociais — ou gangues — entre os detentos já não é novidade, nem que alguns homens não têm problema em descarregar sua tensão sexual em outros homens; ou mesmo que existe injustiça entre guardas e prisioneiros e entre o indivíduo e o sistema imposto pelos altos escalões. Tudo isso foi repetido com o tempo porque deu certo e marcou seu tempo nesta obra.
Como dito, nem tudo funciona igualmente bem. A parte bruta de “Escape from Alcatraz” é boa por mostrar perfeitamente bem quando as motivações para a fuga surgem e são reforçadas, quando as primeiras idéias começam a ser colocadas em prática, quando o plano toma forma e dá sinais de que pode mesmo dar certo e por aí vai. Nesse quesito, a direção de Don Siegel é essencial na demonstração ao espectador de que tudo pode funcionar. Não só abrir um buraco na parede e cair num corredor convenientemente mágico que leva para fora da prisão, mas também todo o processo de quebrar pequenos bloquinhos de concreto e despejar a poeira em algum lugar discretamente. No entanto, quase toda tentativa de expandir este conceito acaba sendo uma tentativa tosca e rasa, como introduções de personagens que fazem pouca ou nenhuma diferença. A experiência sofre por ser pouquíssimo mais do que pessoas fugindo da prisão. Direto ao ponto demais da conta, fim de filme.