Quem dera o filme fosse tão bom quanto a música. Quando comprei o box de 50 anos de 007, tive que esperar alguns meses para a encomenda chegar e aproveitei esse tempo para elevar a antecipação ao máximo e escutar as trilhas sonoras, já que a série é bem conhecida por suas músicas-tema. E a maioria delas é excelente também, com apenas algumas causando uma impressão mais modesta e pouquíssimas ruins de fato. O tema homônimo de “Diamonds Are Forever” foi um dos que mais se destacou, um forte candidato a melhor de toda a série. Ouvindo a canção e vendo os créditos de Maurice Binder várias vezes, quase cheguei a criar uma imagem de que o filme seria ótimo. Quem dera.
James Bond (Sean Connery) está mais sério do que nunca. A recente perda de sua noiva pelas mãos de Ernst Stavro Blofeld (Charles Gray) coloca o agente em uma missão estritamente pessoal em busca de vingança. Com as contas acertadas, Bond é enviado em uma nova missão para investigar a movimentação suspeita de diamantes que são contrabandeados e nunca reaparecem no mercado, tendo de se passar pelo contrabandista responsável pelo transporte das jóias. No caminho, acaba conhecendo Tiffany Case (Jill St. John), uma cúmplice que não sabe exatamente no que está metida.
Finalmente com o box em mãos, assisti aos seis primeiros com toda a atenção porque também estava muito ansioso para vê-los, alguns deles estão entre os melhores de toda a série. Foram cinco filmes com Sean Connery, um com George Lazenby e então mais um com o retorno de Connery. Sempre é estranho pensar no assunto porque não faz muito sentido um ator consolidar o papel e o personagem na cultura popular, sair e do nada um modelo australiano entrar em seu lugar. Como se não fosse o bastante, o tal modelo rejeita contrato de sete filmes e faz apenas um, deixando o papel vago novamente para um retorno bem divulgado de Connery com salário recorde na época.
Já foi dito que o ator não gosta do personagem e que lhe daria um soco se pudesse. Há quem diga que não se deve cuspir no prato que comeu, há quem diga que ninguém é obrigado a gostar de nada, nem mesmo de seu trabalho. Talvez a ocupação de ator não deixe de ser, no fundo, um trabalho como qualquer outro. São poucas pessoas que triunfam nele, sim; o salário, fama e dinâmica são diferentes, sim; e, mesmo assim, não deixa de ser uma forma de ganhar dinheiro em troca de algo. Claro, muitas vezes a questão da paixão pela ocupação é mais presente que em outros casos. Também pode ser menos presente, como em “Diamonds Are Forever”. A primeira coisa que soou errada foi justamente o retorno. “Interessante ele voltar depois de abandonar o papel”, foi o que pensei antes de passar a desejar que ele nunca tivesse voltado.
Connery perde parte do charme de antes. Em parte por estar visivelmente mais velho e… descuidado? Faria sentido compensar a primeira parte com a segunda, se esforçar para melhorar a aparência em vez de apresentar um Bond fora de forma e com as sobrancelhas por fazer, por exemplo, além de um guarda-roupa que erra feio em algumas situações. De todas as coisas, nunca esperava ver Bond usando uma gravata curta, larga e cor-de-rosa enquanto luta com uma dupla de mulheres acrobatas fortes, Bibi e Thunder. Pior ainda é ver que Connery não demonstra empolgação alguma, chegando a ser comum comentários sobre a interpretação ser preguiçosa e desleixada, com o resto da caracterização sinalizando exatamente isso. Parece que não há mais o mesmo cuidado com a aparência charmosa do personagem nem com a performance por trás dela, com “Diamonds Are Forever” marcando a primeira vez em que o próprio Bond decepciona, um ponto negativo em seu próprio filme.
Talvez fosse melhor Roger Moore ter entrado dois anos antes? Não exatamente. “Diamonds Are Forever” tem outros problemas mais graves que a representação de James Bond. A série já tinha sua fórmula bem definida nesse ponto, além de este não ser um filme que tenta sair dos moldes. Se Moore tivesse começado antes seu período como James Bond, poderia não ter durado tanto tempo por estrear em uma obra pouco original e que usa mal os ingredientes clássicos. Uma história que dá uma má continuidade ao arco do anterior, vilões bestas, direção amadora, um Bond insosso e efeitos especiais ainda piores.
“Diamonds Are Forever” não começa um desastre total. As primeiras cenas trazem um implacável James Bond procurando por Blofeld sem descanso. Cena vai, cena vem e a seqüência pré-créditos é concluída de forma boba, muito menos cruel do que se esperaria de um homem consumido pelo desejo de vingança. Já são dois problemas se apresentando de uma vez: o tom leve de uma história que não se leva a sério nem consegue ser engraçada na proposta; e uma oportunidade desperdiçada de continuar um dos melhores arcos de 007. Essa é também a primeira vez que tom semi-humorístico e anticlimático marca presença. A sensação de perigo é zero e alguns elementos se destacam como representantes dessa bobagem explícita. Os capangas principais são uma dupla gay que se comunica usando trocadilhos e usa o nome do outro ao fim de cada frase. Sem graça, nem um pouco ameaçadores e bem ridículos.
Quando finalmente chega o clímax, o espectador já está desiludido e esperando pouco. “Diamonds Are Forever” consegue se superar pela primeira vez ao mostrar que o fundo do poço pode ser ainda mais. O trecho que deveria ser o mais intenso e empolgante é o mais tosco de todos. Bond é capturado de novo e de novo, depende de sua namoradinha tonta para ter algum sucesso e derrota o vilão que nem uma criança e seus brinquedos. Nem mesmo existe lógica quando o filme esquece quantos helicópteros estavam no ar de uma cena para outar.
Com os piores capangas, uma ação de acertos modestos e erros freqüentes, idéias subutilizadas e um tom inapropriado, “Diamonds Are Forever” aparentemente não tem quase nada a seu favor. Algumas poucas coisas prestam. A trilha sonora, quando bem aplicada, traz a essência do que fez as melodias de John Barry tão marcantes para a série, principalmente quando acompanha seqüências boas como a perseguição nas ruas de Las Vegas — ela não se deixa estragar pelo final questionável. Jill St. John é uma Bondgirl interessante até perder o intelecto no clímax. Sobra, talvez, a briga no elevador como um dos pontos altos inquestionáveis de uma obra que tem fugas de buggy lunar e outra Bondgirl que só serve como furo de roteiro.