Não falo nenhum absurdo quando digo que Meryl Streep e Cate Blanchett são as duas melhores atrizes em atividad, basta ver os diversos prêmios e ovações que ambas recebem. Sendo assim, se a intenção é conhecer a carreira de alguém acho que faz todo o sentido procurar pelos trabalhos mais consagrados. No caso de Streep, três Oscars dão uma boa direção: o primeiro em “Kramer vs. Kramer“, o segundo em “Sophie’s Choice” e o terceiro quase 20 anos depois em “The Iron Lady”. Mas enquanto não tenho reclamações sobre o primeiro filme, devo dizer que saí um pouco decepcionado do segundo.
Não é a performance de Streep o problema, longe disso. “Sophie’s Choice” é apenas outro caso de boa atuação num filme mediano. A não ser que um papel que envolveu tanto esforço seja considerado ruim, aí realmente não há um porto seguro para este filme de Alan J. Pakula. Aqui, Meryl Streep interpreta uma polonesa que passou por um campo de concentração alemão e vive nos Estados Unidos. Poderia ser um simples caso de emular um sotaque eslavo e atuar normalmente, mas não: Streep aprendeu a falar alemão e polonês para que sua atuação fosse fidedigna. Foi o caminho difícil, e talvez o mais certeiro, quando ser uma polonesa que fala bem o alemão é crucial para a história.
Sophie (Meryl Streep) é uma estrangeira com uma grande história por trás de sua expressão agradável. Uma sobrevivente do holocausto, ela agora passa os dias numa pensão com seu namorado Nathan (Kevin Kline), uma pessoa difícil. Sem explicação, ele sai de si e ofende tudo e todos em frenesis psicóticas, ferindo principalmente a já flagelada Sophie, que simplesmente não vive sem ele. Então o jovem Stingo (Peter MacNicol), vindo do sul dos Estados Unidos, chega na pensão para seguir seu sonho e escrever um livro, logo tornando-se íntimo do casal e de todos seus problemas.
Estaria sendo completamente injusto se pensasse em sugerir a atuação de Streep como um ponto negativo em “Sophie’s Choice”, especialmente quando todo o esforço por trás do papel mostra frutos na execução. Não diria que está entre as performances mais formidáveis da história do cinema, como alguns apontam, apenas muito longe de ser considerada medíocre. Se existe um culpado aqui, sem dúvida alguma é o roteiro extenso, falho e desprovido de qualquer noção de estrutura ou carga dramática. Esta é uma história potencialmente impactante, aquela com eventos fortes e segredos enterrados sob atitudes inofensivas. Nas mãos certas, é uma fábrica de sentimentos e viradas desconcertantes. Aqui, infelizmente, é uma história que por tempo demais parece não ter propósito algum se não o de completar duas horas e meia com flashbacks e cenas que não vão a lugar algum. Acredito que a intenção era colocar Stingo como o protagonista que entra na vida de Sophie e Nathan, aos poucos descobrindo as verdades por trás de um casal aparentemente adorável. Em seu primeiro dia na pensão, ele recebe um livro de presente e um bilhete convidando-o para jantar no quarto do casal. Boas vindas, de fato. Então o primeiro gosto da verdade é sentido: uma briga entre Sophie e Nathan solta mais ofensas no ar em 10 segundos que Stingo falou numa vida inteira.
É uma boa introdução. Ela serve como uma pista para o que está por vir, mas nada de bom acaba vindo. Contando com dois arcos — o passado de Sophie e o cotidiano dos três amigos — “Sophie’s Choice” intercala entre um ponto e outro de uma forma que não parece natural, tanto pelo passado ser contado através de longos flashbacks como por toda o segundo núcleo ser um tanto repetitivo, sem propósito. A dinâmica do começo, inicialmente interessante, se repete à exaustão. Stingo passa tempo com o casal, bons momentos, e então Nathan tem outro surto; machuca todos ao seu redor sem motivo e deixa sua namorada vulnerável o bastante para contar sobre seu passado. Entra um flashback da Alemanha da Segunda Guerra e uma oportunidade de ouro para Streep ostentar seu talento. Isoladamente, essas sequências no passado poderiam render uma boa história, mas aqui não passam de momentos no estilo “sente-se que vou contar uma história”; interrupções artificialmente inseridas em outro arco que nunca foi exatamente chamativo. Stingo não é um protagonista empático, que faz a audiência se identificar com ele, servindo mais como um observador quase passivo dos eventos da história. Dessa forma, a narração fica menos literária e tem a desculpa do protagonista estar relatando aqueles eventos. Ou era essa a esperança do diretor e roteirista, pelo menos.
“Sophie’s Choice” me chamou a atenção por ser o filme que deu um Oscar à talentosíssima Meryl Streep e, depois de assistir, continua sendo efetivamente o único chamativo aqui. Exceto pelo excelente trabalho da atriz, não há uma história comovente, um roteiro bem escrito ou personagens fortes para fazer frente ao que é trazido por Streep. Há apenas enxertos de uma trama pouco engajante e uma estrutura falha, no mínimo. O sucesso de uma atriz não é o bastante para sustentar um filme inteiro.