Mel Gibson é um ator que tomou um belo baque de sua vida pessoal. Uns comentários infelizes aqui, dirigir alcoolizado ali e uma carreira de mais de 30 anos foi quase destruída. Depois de um hiato de 6 anos foi anunciado em 2010 seu retorno com “Edge of Darkness”, desde então ele tem feito mais ou menos um filme por ano. Não é como se ele tivesse desaparecido do planeta, como alguns comentários sugerem, embora seja indiscutível que sua popularidade nunca tenha voltado ao que era antes. “Blood Father” — um filme pura e simplesmente de ação — está sendo divulgado como mais um retorno de Gibson, mas será que é desta vez que ele volta mesmo?
John Link (Mel Gibson) passou boa parte de sua vida na cadeia por causa de seu estilo de vida peculiar. Sua companhia não era das melhores e sua lealdade acabou o afastando do resto do mundo. Nesse meio tempo ele perde contato com Lydia (Erin Moriarty), sua filha que fugiu de casa para viver ao lado de um traficante mexicano. As coisas dão errado quando ela se envolve demais nos negócios alheios e se vê caçada pelos mesmos capangas que trabalhavam para seu namorado. Sem muita alternativa, ela pede ajuda ajuda para a única pessoa em quem pode confiar: seu pai, que agora tenta levar uma vida longe do crime.
Se “Blood Father” tem alguma coisa a provar é que nem controvérsias, nem o tempo mudam o fato de que Mel Gibson é um grande ator. Seus inúmeros feitos no passado — de “Mad Max” a “Braveheart“— sempre reforçaram isso. Hoje, não posso dizer que esta obra está entre seus melhores trabalhos, apenas que sua interpretação é um dos pontos mais fortes aqui. Fica mais fácil quando o ator pode contar com um script cheio de diálogos espertos, dando a ele um empurrãozinho a mais na hora de entregar uma atuação convincente. Aqui Gibson entra no modelo do personagem que viveu muito tempo do outro lado da cerca até finalmente levar uma vida nos trilhos. Mas como todo mundo sabe, as coisas nunca funcionam tão bem assim. Metaforicamente falando, até daria para dizer que essa vida pacata é o tempo que o ator passou fora dos holofotes, então sair dela para voltar ao estrelato é algo que ele deseja muito. Se foi essa a intenção, não importa muito, o resultado é o mesmo: Mel Gibson está completamente confortável no papel e mostra isso numa interpretação sublime. Ele começa cauteloso e moderado até que a situação pede por medidas mais radicais, então ele se entrega aos costumes do passado para fazer o que é preciso e dizer o que algumas pessoas precisam ouvir. Não muito diferente da maneira como o ator se porta diante das críticas: ele só não liga mais.
Sozinho, Gibson já chama a atenção com seu homem das cavernas desajustado; junto com Erin Moriarty ele tem a oportunidade de interagir com alguém no mesmo nível de barbárie. Só uma rebelde poderia acompanhar um bruto como John Link. Dessa adição não surge apenas outra personagem forte como também uma peculiar relação entre pai e filha. Ele passou 9 anos preso e depois virou tatuador num trailer no meio do deserto; ela saiu de casa aos 17 anos para morar com um traficante. Estas não são pessoas que se encaixam na sociedade como outras, elas se viram na base do murro como se fosse uma coisa normal e não estão muito preocupadas com isso. Felizmente, “Blood Father” não se trata de uma história de normalidade. Então entra o roteiro com boas cenas de ação e um ritmo bem equilibrado, que coloca os protagonistas contra a parede e dão ainda mais oportunidades para eles se aproximarem. O pai tentava ficar na linha na esperança de encontrar a filha e mal sabia que seriam seus maus hábitos que a trariam de volta. Ela é esperta para a idade dela, ele tem os anos de experiência nas costas que faltam à ela. Entre tiroteios e perseguições sempre sobra um tempo de qualidade entre pai e filha, ou seja, ele tentar dar um bom exemplo enquanto abre rombos em outras pessoas.
Em cima de um ritmo sólido uma duração de apenas 88 minutos não deixa as coisas se estenderem demais. A ação bem dosada nunca deixa o clima ficar morno, e sendo bem dirigidas por Jean-François Richet não há como reclamar do que é entregue. Tudo funciona perfeitamente. Isto é, até a conclusão, na qual “Blood Father” perde a oportunidade de fechar bem sua história cheia de energia quando mostra uma incrível falta de entusiasmo. Este é um ótimo exemplo que mostra a importância do final para uma história, como ele pode estragar um filme sem muito esforço. Mesmo sendo poucos minutos de erros em relação ao resto da obra, quaisquer vacilos nessa parte pesam muito mais que uma lentidão no segundo ato, por exemplo. A recompensa do tempo investido está justamente nesses momentos finais, é ali que se descobre onde John Link vai parar após fugir o filme todo, depois de cometer uma boa porção de violações de sua tão zelada condicional. Para falar a verdade, acredito que nem seja uma questão de roteiro, mas de direção; por mais que os eventos estejam premeditados pelo script, sempre há uma maneira de valorizá-los mais com uma apresentação visual mais empolgante. No fim, é um tanto decepcionante ver que personagens tão bem desenvolvidos terminam numa nota tão anti-climática, a conclusão tem um descuido incondizente com o que vem antes.
É triste que depois de cenas de ação com personagens bem construídos venha um final que não está à altura de tudo isso. Mas e no fim, “Blood Father” ainda presta? Sim, só não diria que é o melhor da carreira de Mel Gibson ou perto disso. A única questão que permanece é se o ator vai ganhar ao menos um pouco de sua popularidade de volta. Mesmo que o filme não seja dos melhores, sua atuação mais do que justifica um retorno às grandes produções.