Depois de “Batman v Superman“, Zack Snyder não era exatamente o cara mais querido em Hollywood. Seu nome estava em toda a parte, o que diziam sobre ele, por outro lado, não eram exatamente mil maravilhas. Alguns fãs até aplaudiram o resultado final, enquanto outros fizeram abaixo assinados para retirá-lo da direção dos filmes da DC Comics. Antes de qualquer tipo de controvérsia, porém, Snyder dirigiu “Dawn of the Dead”, seu primeiro longa metragem e remake do original de 1978. Diferente do que podem pensar — considerando outras obras suas — o diretor não faz um mau trabalho aqui, entregando um dos melhores filmes de zumbi que já vi.
O cenário é exatamente igual ao “Dawn of the Dead” antigo: a história se passa num imenso shopping center, intocado pelo apocalipse fora de suas portas. Pega de surpresa pelo caos que tomou conta do mundo, Ana (Sarah Polley) tenta fugir da confusão, mas acaba se abrigando num shopping com outros sobreviventes — incluindo o policial Kenneth (Ving Rhames) e Michael (Jake Weber), vendedor de TVs. Juntos eles devem decidir como proceder para se salvar dos zumbis, uma vez que os luxos do lugar não vão sustentá-los para sempre.
Devo confessar que estava um pouco receoso de revisitar “Dawn of the Dead” depois de lembrar do meu gosto de anos atrás. Talvez naquela época eu era menos exigente e acabei gostando muito por se tratar de zumbis, mas não: a obra é realmente boa. Assistindo ao clássico — tratado como obra prima cult e até como o melhor de Romero — encontrei um bom trabalho, embora tenha ficado um pouco desapontado por não ter visto toda essa empolgação correspondida. Por sorte a obra de Zack Snyder é um dos melhores remakes de todos os tempos, equilibrando perfeitamente as novas adições para não fazer o longa ser um mero chamariz de dinheiro, algo que copie a original demais ou apenas use nome para se vender.
A principal mudança deste novo “Dawn of the Dead” é o comportamento dos zumbis: em vez de usarem números para compensar a burrice e lentidão, os monstros aqui são tão rápidos quanto numerosos. Alguns podem dizer que isso é um crime contra a idéia original, enquanto eu acho que foi uma decisão que funciona muito bem para uma nova audiência. Depois que muitas outras obras de zumbi saíram, explorando e até satirizando o gênero, ficou mais difícil tornar o mito do monstro acreditável. “Como alguém pode morrer para um bicho tão idiota? Para sobreviver é só…” — alguns espectadores com certeza devem ter pensado. Eis que este longa apresenta uma novidade para os insatisfeitos, colocando zumbis que não só comem carne, mas que também disparam-se em direção às suas vítimas. Sobrevivência torna-se uma questão de reflexos e aptidão física além de simplesmente manter a cabeça no lugar, resultando numa história que se baseia menos nos conflitos morais entre humanos e mais no calor do momento. Um embate contra um inimigo mais apto e competente.
Como mostraram “300” e “Watchmen”, outros trabalhos do diretor, existe uma certa tendência a cenas de ação e produções mais bombásticas, se posso dizer. Um grande espetáculo é sempre favorecido, dando um ar Hollywoodiano a tudo que suas mãos tocam. Por um lado isso funciona. A ação guiar o roteiro de “Dawn of the Dead” não é ruim, pois realmente acertam na maneira como as convenções de gênero são aplicadas ao contexto apocalíptico. O zumbi se torna uma ameaça de verdade e todo o clássico cenário do mundo virar ao avesso de um dia para o outro fica plausível; é mais difícil se preparar contra um inimigo que em dois toques está arrancando um pedaço do seu braço. Combinando isso com uma maior gama de armas de fogo e atritos constantes entre os sobreviventes o resultado é uma história que não para por muito tempo para estabelecer nada. Sua prioridade é seguir em frente dando atenção especial ao movimento: perseguir, atirar, fugir, brigar. Toda perda de crítica social e desenvolvimento entre personagens acaba sendo compensada por uma ação de qualidade, especialmente quando essa é uma especialidade do diretor. Fica ainda mais fácil se, assim como eu, o espectador não achar o apelo subjetivo do antigo tão atraente. É mais fácil gostar de uma obra que foca na ação e tem orçamento para executá-la muito bem.
Uma produção menos humilde costuma ser um ponto positivo, afinal dinheiro bem investido traz bons resultados. Complica apenas quando esta mesma tendência ao espetáculo traz consigo alguns dos clichês criticados tão duramente pela audiência dita culta. Ainda que eles usarem esse argumento para toda e qualquer obra Hollywoodiana tenha se tornado tão clichê quanto os vistos nos filmes, eles não deixam de ter um ponto válido quando essas coisas acontecem, tipo Snyder forçando a barra na direção. No começo isso é um pouco pior que no resto do longa, parece que ele não está bem seguro das técnicas ao seu dispor. Infelizmente ele tem certa mania de cinematografizar algumas cenas tão banais que fica clara a inexistência de qualquer efeito dramático. Um close numa tragada de cigarro em câmera lenta pode ter mil significados se a história tratar de fumo ou da saúde do fumante, por exemplo, enquanto essa mesma cena acontecer fora de contexto não tem sentido algum. Isso se repete algumas vezes em momentos realmente inesperados, os quais surpreendem o espectador pela falta de tato do cineasta. O mesmo pode ser dito de algumas explosões exageradas e romances forçados entre personagens, todos ali quase como itens numa lista de clichês toscos.
Alguns desastres em câmera lenta de lado, “Dawn of the Dead” é um excelente filme. Ele muda o tom do original e coloca a ação como uma influência muito mais forte, deixando de lado as brigas dos vivos para focar no perigo que vem de fora. Deslizando por vezes nos clichês e na direção vacilante, este longa ainda consegue ser bom o bastante para superar o que George A. Romero criou 26 anos antes. As propostas de fato diferem, mas sinto que o remake de 2004 se sai melhor em seus objetivos.