A história da baleia Moby Dick já é bem conhecida por aí. Se não em detalhe, o nome com certeza é reconhecido. Considerada uma das obras quintessenciais da literatura americana, o conto da cachalote branca que aterrorizava navios baleeiros foi inicialmente uma falha comercial, sendo outra obra de arte que fez seu nome ao longo dos anos. Quase duzentos anos depois da publicação original e diversas adaptações para o cinema depois, “In the Heart of the Sea” é lançado. Esta história, ao contrário do que foi frequentemente sugerido na publicidade, não é uma adaptação moderna de “Moby-Dick”, mas sim uma adaptação do livro que compartilha o mesmo nome do filme, publicado em 2000 e escrito por Nathaniel Philbrick.
O livro conta a história real do baleeiro Essex, afundado por uma baleia em 1821 e que deixou sua tripulação à deriva no oceano por 90 dias. A obra foi baseada nos relatos escritos de dois marinheiros sobreviventes. O enredo do filme, por outro lado, romantiza um pouco mais essa premissa. Um escritor desmotivado vai atrás do último sobrevivente do tal incidente na esperança de conseguir conteúdo para seu novo livro, mas o ex-marinheiro mostra-se inflexível para contar sua história. Após um pouco de convencimento, o homem relata em detalhe o conto de sua trágica viagem com Owen Chase (Chris Hemsworth) e George Pollard (Benjamin Walker), o imediato e o capitão do Essex.
Ao final de tudo, fica explícito que as liberdades criativas tomadas têm um propósito maior que simplesmente suavizar o conteúdo não-ficcional do livro. Queriam criar mais munição para a publicidade da obra. Desde o começo deixam claro que esta não é outra adaptação do clássico americano, mas mesmo assim fazem questão de mencionar o nome da fera algumas vezes para conectas as duas coisas. A única ligação de verdade é que o náufrago do Essex inspirou o livro “Moby-Dick”, mais do que isso já é ficção. Não reclamo dessa romantização por conta de não fazer diferença alguma, no final das contas. “In the Heart of the Sea” não sofre por tentar expandir seu horizonte publicitário e ainda consegue ter uma boa dose de sucesso com o material que se propõe a abordar.
Em suas mãos o espectador encontra diversos pontos que caracterizam esta história como algo bem mais profundo do que o título e as imagens promocionais sugerem. As oportunidade para tornar o enredo superficial foram várias: este poderia ser um conto da luta entre o homem e a natureza selvagem; do conflito entre dois homens, aquele que nasceu para um trabalho e o que nasceu no trabalho; ou dos limites da sobrevivência do homem. No entanto, este longa pega todas essas idéias e entrega uma trama multifacetada sobre uma viagem que deu errado por vários motivo, uma tragédia que foi lembrada mais como inspiração para a ficção do que como um evento isolado. Tantas bases podem fazer alguém pensar que o problema aqui é a falta de foco, a tal obra que procura colocar tudo no mesmo pacote e acaba não sendo verdadeira com nenhuma delas. Felizmente, este não é o caso, uma vez que não pender muito para nenhum lado funciona melhor que como de costume. Não se dedicar excessivamente a um só ponto do enredo tem seus benefícios, pois faz com que o espectador não desvie sua atenção da narrativa complexa que se estabelece e assim acompanhe melhor os eventos.
Mas isto quer dizer que a abordagem dos elementos da trama é propositalmente rasa? Não, com certeza não. Eles apenas são manipulados — no sentido de ter mais tempo de tela ou menos — de forma que nenhum tenha predominância. Evitando que surja aquele cansaço de quando o as coisas parecem estar se desviando da proposta original, indo longe demais da proposta inicial. Estão sempre mudando o foco e construindo cada núcleo pouco a pouco até que o resultado seja um emaranhado que aprofunda uma simples caça à baleia. Pensando melhor, talvez haja um efeito negativo quando se fala em premissas e publicidade. Ambos procuram ser atraentes para o público e ambos podem acabar limitando a expectativa do espectador antes mesmo do lançamento. Em termos concretos, referentes a um impacto na qualidade da obra propriamente dita, meu julgamento de que esta política é inofensiva permanece; embora haja o risco de que o público se divida perante a insistência de ligar o material com ícones da literatura, como a tal Moby Dick. Não desmereço o livro clássico de forma alguma, mas ressalto que o conteúdo deste longa-metragem tem substância por si para não precisar de muletas históricas, que podem até ser negativas por causa do risco de possíveis preconceitos. Esta não é outra tentativa medíocre de tirar dinheiro de uma obra clássica.
Com visuais bonitos, repletos de detalhes e personagens carismáticos para refletir o competente enredo, este é um longa-metragem com pouca margem para a frustração. Além disso, “In the Heart of the Sea” ser um boa experiência ainda conta com dois benefícios: agrega volume aos poucos filmes realmente bons de 2015 e é um candidato válido para fechar o ano com chave de ouro caso “Star Wars: The Force Awakens” falhe.