Caracterizado por muitos como o filme de monstro do mestre do suspense, “The Birds” trabalha o já conhecido conceito de aberrações em filmes de terror através dos olhos de um dos diretores mais consagrados da história. Enquanto filmes japoneses e americanos usavam criaturas sobrenaturais como o foco de suas tramas, o diretor humaniza um pouco o conteúdo ao fazer de pássaros, como corvos e gaivotas, o Godzilla de sua carreira. Seguindo o sucesso de “Psicose”, Hitchcock se mantém no gênero Terror com esta obra, que mesmo não sendo uma de suas melhores, é uma das mais icônicas.
Quando uma casual figura do passado ressurge na vida de Melanie Daniels (Tippi Hedren), a mesma vê neste encontro uma chance de sossegar e arranjar um marido. A tal figura é Mitch Brenner (Rod Taylor), um advogado solteirão que passa seus fins de semana com a família no litoral da Califórnia. Após um encontro no mínimo curioso entre os dois em um aviário, Melanie decide surpreender Mitch na pequena cidade onde sua família mora. Mas quando pássaros aparentemente inofensivos passam a atacar sem motivo, o pacífico ambiente da cidadezinha do interior vai rapidamente de tranquilo para perigoso.
A parte interessante da abordagem de Alfred Hitchcock em cima dos monstros é que não há explanação nenhuma para os eventos centrais da trama, no caso os ataques. Diferente de famosos exemplos que explicam a origem da fera – como o próprio Godzilla que tem sua origem usada como crítica sociocultural – aqui não se tem nem ao menos uma dedicação sobre o porquê de tudo aquilo. Embora céticos possam querer apontar isso como uma falha, não se pode dizer que a questão é simplesmente ignorada: é feito um trabalho interessante em cima dessa dúvida quando personagens são inseridos justamente com intuito de questionar a situação. Em uma das melhores cenas do filme, o suspense psicológico é trabalhado como poucos diretores conseguem, e quem mais que não Hitchcock para manipular tão bem as emoções da audiência?
Em questão de efeitos especiais, um esforço notável é demonstrado na construção das cenas onde os pássaros atacam. Não vou dizer que os efeitos e a realidade estão lado a lado aqui, pois não é bem o caso. Através de um olhar mais atento, que é facilitado em alta resolução, pode-se notar a disparidade entre as cenas gravadas com os atores e as cenas inseridas através da edição. Mesmo assim, não é uma dissemelhança feia a vista aqui, mas sim uma que demonstra o charme por trás da montagem das cenas. Em uma sequência onde um bando de pássaros invade uma casa, por exemplo, pode-se notar que as aves foram gravadas sob uma tela verde, sendo sobrepostas em cima dos atores que fingem ser atacados e se mesclam tão organicamente ao ambiente. Não é nenhum marco no uso de efeitos especiais, mas claramente este não é um exemplo onde é fácil se desconectar do que está sendo mostrado na tela.
Apesar de poucos, os defeitos deste filme não se mostram nem um pouco ausentes. Particularmente alguns pontos não foram tão bem executados como outros, tal como pode ser notado no relacionamento entre os dois protagonistas. A princípio, o modo como a relação se desenvolve é interessante, caminhando gradualmente para o que é inevitável: a consumação do relacionamento. Vemos ambos ora trocando farpas, ora se aproximando, mas quando finalmente o casal se une, parece que falta alguma coisa. O mesmo pode ser notado no enredo em geral, que é muito bem desenvolvido e levado adiante através de um ritmo muito equilibrado, mas no final falha em entregar uma conclusão realmente satisfatória. Havia um final mais comprido nos planos iniciais, mas de acordo com o próprio diretor, este foi descartado completamente pois o novo deixava o destino dos personagens no ar. Sinceramente, a única coisa que é deixada no ar é por que este incompleto e súbito final foi escolhido em vez do outro.
Executando tensão e suspense como ninguém, Hitchcock entrega um dos filme ritmos mais equilibrados de sua carreira, fazendo deste um filme muito fácil de se ver e digerir. O único problema seria justamente o longa não concluir as idéias tão bem quanto o mesmo as desenvolve, fazendo tudo perder um pouco do encanto tão bem pintado ao longo do enredo.