Outro dos filmes que seguem a mesma linha de “Sunset Boulevard“, este longa-metragem diminui o escopo ao selecionar apenas algumas partes da mencionada obra para desenvolver sua trama. Enquanto o trabalho de Billy Wilder elabora uma amplitude de aspectos, indo desde o drama da estrela decadente até o envolvimento com o roteirista falido, este filme escolhe a dedo a parte psicótica como foco. Em Norma Desmond podia-se notar uma loucura obsessiva em torno de sua glória no cinema mudo; entretanto, a loucura aqui chega a ser ainda mais distorcida, diminuindo a parte do sucesso e aumentando toda a fatia miserável dessa obsessão.
Atriz infantil do Vaudeville, Baby Jane Hudson (Bette Davis) brilhou nos palcos enquanto sua irmã Blanche Hudson (Joan Crawford) era posta de lado. Anos mais tarde, ambas as irmãs se encontrariam fazendo filmes em Hollywood, mas dessa vez é a irmã esquecida quem atinge o status de celebridade enquanto a outra faz apenas filmes pequenos e de pouco sucesso. Inusitadamente, o jogo vira mais uma vez e em um acidente de carro Blanche fica paraplégica justo quando sua carreira estava no auge. Envelhecendo ao lado da irmã em uma mansão velha de Hollywood, Baby Jane trata a mesma cada vez pior ao passo que sua sanidade se deteriora.
Seguindo uma direção mais voltada ao Terror em vez do Drama ou do Noir, como visto no filme de Wilder, este filme usa de elementos comuns ao gênero para construir os pilares de sua estrutura distorcida. Por ir mais estritamente nessa linha, são implementados aspectos como o choque visual do conteúdo forte e um notável exagero das demências do ser humano. Enquanto um destes fala por si mesmo, o outro é traduzido para as telas através das duas grandes atrizes escolhidas, Davis e Crawford. Populares rivais em sua época, nenhuma das damas fez questão de poupar palavras ácidas a outra, embora tenham trabalhado juntas em mais de uma ocasião. Bette Davis é quem tem o maior espaço para brilhar, atuando como a perversamente insana Baby Jane em uma interpretação no mínimo influente para o Terror, se não totalmente icônica por si. Sem desapontar, Davis entrega surpresa atrás de surpresa ao apresentar de maneira convincente a deterioração progressiva de sua personagem, sutilmente adicionando seu cínico falar a Baby Jane. O único porém se encontra na reduzida oportunidade de atuar de Crawford, que deixa na boca do espectador apenas um gostinho do que poderia ser uma épica representação ficcional da rivalidade entre as duas.
Por outro lado, algus elementos não acertam tão bem como as atuações, fazendo um potencial melhor filme se tornar algo mais próximo de uma decepção. Embora seja um dos aspectos relevantes na hora de avaliar um filme, a trilha sonora dificilmente se destaca como um dos principais fracos do filme. Normalmente, a mesma costuma ser notada quando sua qualidade é alta, realmente se sobressaindo além das imagens; ou no máximo cumprindo seu papel bem o bastante para se retirar às sombras até o filme acabar. O caso aqui é que a mesma parece não estar em sintonia com os eventos do filme, como se o compositor ao menos soubesse do que as cenas se tratavam antes de inserir as canções da trilha. Sendo este um drama mais obscuro, era de se imaginar que temas mais sóbrios seriam usados, em vez dos infantis e até animados utilizados. Provavelmente as melodias vibrantes foram usadas para estabelecer um contraste, colocando de um lado a jovialidade da Baby Jane do passado e do outro a Jane decadente do presente, mas este efeito simplesmente não é o que se atinge.
Além de interpretações mais que satisfatórias, há um notável ponto positivo no que se refere a ambientação do filme. Através de simples, porém potentes, cenários pode-se ter uma imersiva impressão do que é sofrer pelas mãos de um ser tão inadequado quanto Baby Jane. Resumidos a poucos cômodos, os ambientes ilustram perfeitamente as limitações de uma paraplégica como Blanche dentro do lar, fazendo assim um inteligente uso do orçamento baixo para criar um sentimento claustrofóbico. Outras surpresas como a presença do personagem de Victor Buono, um músico oportunista, somam para incrementar um pouco a eventualmente desinteressante progressão da narrativa; esta que flutua tanto entre instigante e medíocre que fica difícil saber o que pensar dela no final das contas.
Embora tenha sua boa fatia de erros, estes contidos principalmente na falta de solidez da narrativa e na trilha sonora, “Whatever Happened to Baby Jane?” acerta em alguns pontos bem o bastante para tornar a experiência satisfatória. Elementos como a personalidade da insana protagonista se mostraram tão icônicos, que muitos filmes de Terror dos anos seguintes usariam a mesma como padrão para a criação de vários de seus vilões; o que apenas reflete quão bem Davis está em seu papel, mesmo em uma fase de baixo sucesso de sua carreira.