Este é um dos clássicos exemplos de filme onde a maioria das pessoas que o assistiram não conseguem o descrever sem revelar o enredo. Talvez por este motivo meu julgamento possa ter sido um pouco afetado, mas acredito que as impressões que tive sobre este longa-metragem são tão imparciais quanto poderiam ser. De qualquer forma, esta recorrência da revelação de um dos pontos chave do filme, o clímax no caso, se deve especialmente pelo mesmo ser tão impactante. Sendo esta obra lembrada por como apresentam o material em mãos, e definitivamente não pelo fator choque ou surpresa.
Inicialmente sem um ponto fixo de onde a trama tem início, pode-se dizer que a história deste longa é centrada em Eva (Tilda Swinton), a mãe de uma família aparentemente normal. Junto de seu marido Franklin (John C. Reilly), Eva se esforça para fazer de sua família algo para se orgulhar, dos filhos sadios ao relacionamento duradouro. No entanto, seu filho Kevin (Ezra Miller) mostra-se como um obstáculo curioso: desde pequeno seu comportamento incomum exibiu-se como um ponto de interrogação na vida da mãe de família. Sem saber bem o que se passa com a criança, a mãe acompanha o desenvolvimento estranho de seu filho, resultando em um relacionamento no mínimo esquisito.
Tão curiosa quanto a própria personalidade de Kevin, a forma como este relacionamento evolui no decorrer do filme é apresentada excentricamente. Tal sensação é passada por conta do filme não ser contado de forma linear, diversos saltos temporais entre passado e presente entregam aos poucos a trama, que começa crua e aos poucos vai se construindo. Isto leva a um dos pontos que me incomodaram um pouco conforme o enredo progredi: embora a escolha de contar um filme de maneira não linear seja incomum, apesar de não tão impopular, aqui ela aparece como algo previsível a partir de certo ponto. Enquanto não se sabe nada sobre quem é quem e o que está acontecendo, a mecânica de não seguir uma linha do tempo funciona muito bem; porém quando o espectador passa a se familiarizar com os personagens e com o enredo, fica um pouco óbvio demais para onde as coisas estão caminhando.
Isto não quer dizer, porém, que os eventos retratados sejam menos impactantes que seriam caso a execução fosse diferente. Claro, não há o fator surpresa, mas ainda assim é possível aproveitar satisfatoriamente o que esta obra tem a oferecer. Por outro lado, no que se refere aos eventos da história em si, há uma certa insistência em estabelecer algumas bases do desenvolvimento da trama. Obviamente, se algo é crucial para como o filme vai se desenrolar, este necessita de um foco maior para que o espectador enxergue a importância planejada pela produção. O problema é que aqui vão um pouco longe demais em certos momentos, esforçando-se um pouco em demasia para passar a mensagem desejada e assim, insultando a capacidade perceptiva do espectador. Para efeito de ilustração, em algumas ocasiões só faltou um cigarro e um bigode pontudo em Kevin para completar a imagem de criança perversa que tanto esfregam na tela da câmera. Se Kevin ser problemático é importante, então manejem bem o ator escolhido para tirar o melhor dele e assim transmitir o que se deseja.
Curiosamente, isso é exatamente o que acontece, fazendo uma das maiores qualidades jogar contra o próprio filme. Como mencionado, alguns momentos são um pouco exagerados em sua semântica, ressaltando um mesmo ponto exaustivamente. Possivelmente, a diretora não sabia bem o que tinha em mãos ao escalar os atores escolhidos, pois o desempenho dos mesmos é tão excelente que qualquer adendo se faz desnecessário. Através das sutilezas de suas interpretações pode-se notar claramente minúcias como traços de personalidade, sentimentos, e até mesmo predições de comportamento. Atores tão bem dirigidos não precisam de qualquer tipo de recurso para suplementar suas performances, tornando todo e qualquer acréscimo um meio de levar o filme para perto da presunção, e consequentemente longe da glória.
Frequentemente mal entendido por grande parte de sua audiência, que parece se preocupar mais em achar um porquê ou um responsável do que simplesmente aproveitar o longa, “We Need to Talk About Kevin” é uma interessante exploração da psique humana. Não importa a motivação de tal personagem, ou quem é responsável pelas atitudes de quem; o que realmente mostra-se como a verdadeira jóia deste longa-metragem é explorar como um problema pode ter diversas explicações, e que nenhuma delas importa tanto quanto a interpretação dos envolvidos. Composto por um elenco forte e interpretações sublimes, esta obra tem sucesso ao explorar todo o conteúdo existente até mesmo no mais vazio dos seres humanos.