Por algum motivo que eu não entendo a tradução de “Dawn of the Dead” resultou em “Zombie – O Despertar dos Mortos” aqui no Brasil. Outro infeliz que entrou para o clube de traduções sem sentido. Mas não foi por isso que esta obra entrou pra história, nem por isso que anos mais tarde, em 2004, Zack Snyder lançou o remake deste longa, atualizando e mudando vários aspectos da fórmula de Romero. Mais do que uma revisitada competente, a obra de Snyder fez esta obra ser conhecida por muitos como o “Madrugada dos Mortos” antigo, uma caracterização mais apropriada que o título brasileiro.
Assim como sua contraparte de 2004, este filme aborda o apocalipse zumbi iniciado em “Night of the Living Dead”, que tomou cidades inteiras e colocou o mundo inteiro sob alerta. Enquanto caipiras se divertem com o apocalipse, um casal e dois membros da S.W.A.T. decidem fugir e acabam se refugiando dentro de um shopping. Sendo o primeiro filme a colocar o apocalipse zumbi dentro de um shopping, este acabou criando um cenário clássico para outras obras de zumbis — como os jogos “Dead Rising” e “Left for Dead 2”.
Pode-se dizer que este longa foi um clássico instantâneo ao continuar bem o que foi criado com seu predecessor, mudando levemente a entonação mais obscura de antes para algo puxado para a ação. Essa transição é feita de maneira excelente, um típico exemplo de quando as continuações partem um pouco do original e continuam boas. Enquanto o primeiro filme tentava ser bem mais assustador e sombrio, este cobiça muito mais com momentos dedicados ao humor e até ao calor do momento, com carnificina e tiros para todos os lados. Independente do foco em questão, a ambição mostra-se muito melhor apoiada pela diferença de mais de U$500.000 no orçamento entre o original e este.
Tom Savini foi a cabeça por trás do departamento de maquiagem do longa, pintando e decorando os rostos de todos os zumbis vistos. Savini tinha sido considerado para o cargo do primeiro filme, mas acabou sendo despachado para o Vietnã antes de poder ser contratado. Sendo assim, “Martin”, de 1977, foi seu primeiro trabalho com o diretor George A. Romero. Mesmo sendo fã do trabalho de Savini, a maquiagem parece um tanto datada nos dias de hoje. A pintura aplicada nos zumbis, em especial, parece muito artificial em vários momentos; mais por conta da maquiagem ser aplicada só no rosto, esquecendo de partes visíveis como as mãos ou o próprio rosto. Nessa jogada, a imersão se quebra, visto que as criaturas comuns estão em maioria. Por outro lado, quando os zumbis têm papéis mais centrais esse desleixo some e a magia de Savini mostra presença.
Datada também está a trilha sonora, composta principalmente de músicas do estoque de uma empresa de produção musical. Todas as melodias usadas foram gravadas por artistas sob contrato desta empresa, que licencia tais trilhas para uso em mídias como o Cinema e a Televisão. O motivo provável por trás da música ser tão fraca é justamente ela não ter sido composta com o filme em mente. Poucas cenas são exatamente condizentes com a música de fundo e na maioria das vezes ela simplesmente tem um caráter datado de Anos 70 — com bipes e sons com uma pegada meio disco.
Decepcionando levemente na parte das pinturas faciais, Savini se redime e muito com os efeitos especiais de violência, que se mostram essenciais e fazem toda a diferença quando comparados à tosca violência de antes. Toda a parte com zumbis tomando tiros, tendo cabeças estouradas e braços arrancados é tão bem feita quanto poderia ser. Não puxando tanto para o lado realista da coisa — o sangue, por exemplo, é muito vermelho — Romero chega a criar um clima próximo ao de histórias em quadrinhos. Por vezes pode-se ver de onde os quadrinhos de “The Walking Dead” tiram inspiração, principalmente quando a surrealidade dos gibis é vista no enredo.
Os que procuram algum tipo de semelhança com o remake de 2004 certamente se decepcionarão, o remake consegue ser único o bastante para proporcionar uma experiência completamente diferente. Mesmo com essa mudança relativamente drástica de tom, “Dawn of the Dead” consegue ser muito bom em quase tudo o que se propõe. Seu pecado fica exatamente nas partes em que a negligência é óbvia, como a pavorosa trilha sonora. No final das contas ainda é um clássico do cinema que merece ser assistido por qualquer fã de filmes de Zumbi e do Terror.